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segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Um dos nossos projetos em 2min

   Ano passado, nosso grupo de pesquisa teve a honra de participar como pano de fundo do projeto Geração Futura Universidades Parceiras. Trata-se de uma iniciativa do Canal Futura para estudantes da área da comunicação. O Roger Gritti, estudante de Jornalismo da UPF, foi selecionado para representar a nossa Universidade e ganhou a chance de participar de diversas oficinas de audiovisual na sede do Canal Futura. Como tarefa, ele precisou desenvolver um vídeo, desde o processo de roteiro até a finalização, e o tema deste vídeo foi um projeto de pesquisa desenvolvido na nossa Universidade.

  Então o Roger me procurou pois o projeto em questão tem bastante elementos visuais que ele poderia aproveitar (equipamentos, modelo animal, etc...). Gravamos o vídeo e o resultado do trabalho do Roger pode ser conferido nos intervalos da programação do Futura, ou logo abaixo. Além desta experiência muito legal, eu também "lucrei" com um videozinho super bem produzido que fala um pouco sobre o nosso trabalho.


 Sou muito suspeita pois eu acho que envolver-se em projetos de pesquisa é parte fundamental de uma experiência universitária completa. E aqui na UPF nós temos muito espaço para produzir conhecimento. Por isso, você, aluno que me lê, experimente a Iniciação Científica, pois isso pode abrir muitas portas!

  Quanto aos resultados deste projeto, em breve eles aparecem por aqui, pois estamos em fase de finalização dos artigos.

  Parabéns Roger pelo trabalho! E também às minhas bolsistas Jéssica e Patrícia, que tocaram este projeto de pesquisa, pois vocês são as verdadeiras protagonistas do vídeo.


segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Silimarina, um possível aliado contra a hepatotoxicidade



    O ano está terminando e com ele chegam as apresentações dos trabalhos de conclusão de curso. Este é um período muito especial pois é um dos momentos em que o aluno tem a oportunidade de se envolver com um trabalho de pesquisa, testar suas hipóteses e defender suas conclusões perante a uma banca. É sempre muito bom quando os alunos compreendem que podem tirar o máximo proveito desta oportunidade, que vai dar trabalho de qualquer jeito, e se empenham em fazer bonito. Então hoje, vou falar de um trabalho que começou como um trabalho de conclusão da aluna Elza Calegari e hoje encontra-se publicado na revista International Journal of Pharmacy and Pharmaceutical Sicences.

    Quando a Elza me procurou para orientar o TCC dela ela já sabia com o que queria trabalhar: a hepatotoxicidade do metotrexato, observada nos regimes de tratamento para artrite reumatoide. Gostei muito desta sugestão, pois além de ser minha área de interesse, ela estava muito motivada com o assunto por ter presenciado este tipo de reação tóxica em uma pessoa próxima.

  A artrite reumatoide é uma doença inflamatória crônica das articulações que faz com que o paciente tenha dores nas articulações inflamadas. Uma das alternativas terapêuticas para esta doença é o metotrexato, um fármaco que apresenta como efeito adverso a hepatotoxicidade em pacientes que excedem doses de 20mg/semana. Pacientes com artrite reumatoide fazendo uso desta medicação frequentemente a utilizam cronicamente, por longos períodos e doses elevadas, tornando-se mais suscetíveis a este efeito adverso.

 


Silybum marianum
   Então, no TCC da Elza, utilizamos como modelo animal ratos que receberam metotrexato em um regime simulando um tratamento crônico, para desenvolvimento de hepatotoxicidade. Como protetor, testamos a silimarina, que é isolada da planta cardo mariano (Silybum marianum). Este composto nos pareceu promissor devido às suas propriedades antioxidantes e antiinflamatórias, que fazem com que apresente bons resultados na proteção frente à toxicidade de compostos hepatotóxicos. E de fato, neste trabalho, a silimarina foi capaz de proteger parcialmente os danos provocados pela administração crônica do metotrexato, como a peroxidação lipídica hepática. No artigo publicado, apresentamos todos os resultados e discutimos um possível mecanismo envolvido nesta proteção parcial. Interessados em consultar a publicação, ela se encontra disponível aqui.

  A silimarina já é um produto disponível comercialmente na forma de fitoterápico. Fitoterápicos são medicamentos obtidos com o emprego exclusivo de matérias ativas vegetais, com eficácia e segurança conhecidas, como qualquer medicamento. Não confundir jamais fitoterapia com homeopatia, que adota princípios bem diferentes para fundamentar seus tratamentos. Existe um material muito didático e interessante desenvolvido pelo Ministério da Saúde com esclarecimentos sobre os fitoterápicos, que se encontra disponível aqui.




segunda-feira, 11 de maio de 2015

Purificadores de ar a base de ozônio: eficácia e segurança

   O ozônio é um composto que apresenta a ambiguidade de ser considerado vilão ou mocinho em determinadas condições. Ao mesmo tempo que são feitas campanhas para preservar a camada de ozônio, este composto também pode ser considerado um poluente (é tratado como tal pela nossa legislação do CONAMA, Resolução 003/90). E apesar de ser um poluente, alguns "purificadores de ar" realizam a sua função através de geração de ozônio. 
   Soou estranho purificar o ar com um poluente? Para muita gente também! Então hoje vamos falar sobre um projeto que tive o prazer de participar, que foi coordenado pela Prof. Charise Bertol, onde se testou a eficácia e a segurança destes purificadores de ar.

  Primeiramente, algumas definições:
 O ozônio é um gás  colorido, em tons de azul, composto por 3 moléculas de oxigênio. Ele se forma quando as moléculas do oxigênio (O2) se rompem pela ação da radiação ultravioleta do sol. Os átomos separados podem se combinar novamente com outras moléculas, gerando o ozônio (O3).
   A atmosfera tem várias camadas, conforme demonstrado na figura abaixo. A camada de ozônio fica localizada na estratosfera, em uma altitude de 16 a 30km. Esta camada serve para absorver as radiações ultravioletas que vem do sol.


Camadas da atmosfera. Fonte: http://www.mundoeducacao.com/quimica/equilibrio-quimico-na-camada-ozonio.htm


Camada de ozônio na estratosfera, que atua como um escudo para as radiações ultravioletas do sol. Fonte: http://www.ibflorestas.org.br/noticias/584-16-de-setembro-dia-internacional-de-protecao-da-camada-de-ozonio.html

   Já na troposfera, que é a camada mais próxima da superfície da Terra, o ozônio é considerado um poluente secundário. Ou seja, é formado a partir de outros poluentes atmosféricos, como o dióxido de nitrogênio e compostos orgânicos voláteis na presença de radiação solar. O ozônio da troposfera contribui para o agravamento de crises de asma, bronquites e doenças respiratórias no geral. 
   Existem no mercado "purificadores de ar geradores de ozônio". São equipamentos pequenos, portáteis (como o da figura abaixo) e que prometem melhorar a qualidade do ar.


Exemplo de purificador de ar gerador de ozônio.

   O fundamento da utilização do ozônio como purificador de ar se deve ao seu efeito oxidante. Os fabricantes informam que estes purificadores produzem íons que removeriam micro-organismos do ar. O mecanismo desta ação se fundamenta no ataque do ozônio às membranas e paredes celulares, sendo capaz de causar uma situação de stress oxidativo e consequentemente, o rompimento das células dos patógenos. Porém, alguns autores questionam esta atividade. Esta corrente defende que, em concentrações seguras para os seres humanos o ozônio seria ineficaz como descontaminante ou purificador de ar. Em concentrações acima das permitidas, a eventual purificação atingida não se justificaria porque os efeitos negativos do ozônio para a saúde seriam mais prejudiciais do que o benefício conseguido.
  
  Então, primeiramente, vamos aos nossos resultados relativos à eficácia destes purificadores de ar. Posteriormente, voltaremos à questão da segurança:

   Nós testamos o efeito de um purificador de ar (marca Brizzamar) comparando os micro-organismos cultivados em presença do purificador e na ausência do mesmo. Os resultados mostraram que após 1 h de uso do purificador de ar gerador de ozônio, houve uma redução significativa dos fungos presentes no ambiente (72.22%). Após 2 e 3 h de funcionamento do purificador, a redução atingiu 83.43%  e 89.71%, respectivamente. Com relação às bactérias presentes no ar, observou-se uma redução de 34.75% após a primeira hora de funcionamento do equipamento, 74.82% após 2 h e 78.02% após 3 h. O modelo experimental utilizando dois diferentes vírus (BoHV-1 - vírus da herpes bovina e HSV-1 Herpes simplex virus) evidenciou que após 3 h de exposição ao ozônio houve uma redução acima de 90% nos dois vírus utilizados. E nestas condições, a eliminação dos vírus aconteceu sem efeitos citotóxicos para a célula hospedeira. 

Conclusão: Houve uma melhora na qualidade microbiológica do ar após a exposição ao purificador de ar gerador de ozônio. Os melhores resultados foram obtidos após 3 h de funcionamento, conforme recomendado pelos fabricantes.

 E a segurança do uso?

  Como o ozônio é um poluente oxidante, existem níveis considerados seguros de exposição. No ambiente de trabalho, por exemplo, a OSHA (Occupational Safety and Health Administration)  recomenda um limite de 0.1 ppm de ozônio para uma jornada de trabalho de 8 h. No Brasil, o Ministério do Trabalho, através da NR 15, fixou em 0.08 ppm de ozônio como o limite máximo de exposição em regime de até 48 h semanais.
    Nos nossos estudos, a concentração do ozônio no ambiente foi medida e sempre ficou abaixo de 0.05 ppm, o que sugere a segurança do purificador. Este dado é importante porque depõe contra o possível efeito cumulativo do ozônio. Então, para confirmar este achado, colocamos o purificador gerador de ozônio em uma caixa até que ela se encontrasse saturada de ozônio (concentração de ozônio após saturação da caixa = 3.7 ppm). Cinco minutos após desligar o equipamento, os níveis de ozônio reduziram drasticamente (50%) e após 30 min, a concentração de ozônio na caixa era inferior a 5%. 

   Ainda assim, realizamos ensaios in vivo para verificar os possíveis efeitos agudos e crônicos do ozônio, especialmente no trato respiratório. Para isso, ratos foram expostos por 15 dias a uma exposição ao purificador de ar ligado por 3 h/dia (conforme recomenda o fabricante) ou 24 h/dia (uma situação extrema). Outro grupo foi exposto por 28 dias à exposição ao purificador de ar ligado por 3 h/dia ou 24 h/dia. Os resultados foram comparados com animais mantidos sem qualquer exposição ao gerador de ozônio (controles). Os parâmetros avaliados foram a massa relativa dos órgãos, alterações macro e microscópicas dos órgãos, parâmetros hematológicos e marcadores de stress oxidativo sistêmico, além de ensaios de mutagenicidade. 
      Não houve alterações significativas nos animais expostos ao ozônio em nenhuma condição quando comparado aos animais controles.

Conclusão: Neste modelo de exposição, o purificador de ar gerador de ozônio pode ser considerado seguro.

    Se você quiser saber mais sobre estes estudos, aqui você encontra o artigo do trabalho com fungos e bactérias e aqui você encontra o trabalho com os vírus. Os ensaios de avaliação da qualidade microbiológica do ar foram realizados como Trabalho de Conclusão de Curso das alunas Greicy Petry, Karoline Vieira e Angelica Vilani, orientadas pela Prof. Charise Bertol. A avaliação da toxicidade foi realizada pela aluna Larissa Cestonaro e encontram-se submetidos para a publicação. Estes trabalhos foram desenvolvidos no âmbito do projeto Sentinela - UPF Tec.



terça-feira, 17 de março de 2015

A vacina contra o "efeito sanfona"

    Quem nunca fez uma dieta rigorosa, conseguiu emagrecer, mas passado algum tempo, recuperou o peso perdido? A culpa do "efeito sanfona" pode ser da ghrelina! A ghrelina é um hormônio envolvido na regulação do apetite, conforme explicado na figura abaixo:


Em azul, a regulação do estado de saciedade: no tecido adiposo, há a produção da leptina, secretada na corrente circulatória. A leptina suprime a atividade do neuropeptídeo Y, que provoca o apetite e melhora a atividade de compostos envolvidos na saciedade.
Em vermelho: O estômago produz ghrelina, que estimula o neuropeptídeo Y, fazendo o indivíduo sentir fome, ao mesmo tempo que suprime outros compostos que produziriam saciedade.
Fonte: http://bioquimican4med.wikispaces.com/Hormonas+que+intervienen+en+el+control+del+Apetito

   Para os "iniciados na bioquímica", uma figura mais complexa, que mostra pormenores da regulação do apetite. O que chama atenção é que temos muitas substâncias que diminuem o nosso apetite e apenas uma que aumenta... Sim, a ghrelina.




   E se houvesse uma maneira de impedir que a ghrelina atuasse no nosso organismo? É exatamente isso que um grupo de cientistas portugueses está tentando fazer. Hoje, convidei a Sara e o Tiago a falar um pouco sobre este projeto encantador por dois motivos:

   1) Este assunto é muito interessante e vem bem a calhar no pós férias, quando é hora de retomar as metas do ano novo e tentar efetivá-las. Posso apostar que uma das metas de 9 entre 10 leitores do blog relaciona-se com o emagrecimento/manutenção do peso.



   2) Um novo ano letivo inicia-se e gostaria de pedir especial atenção aos meus alunos para este post. Motivem-se a realizar bons trabalhos durante a faculdade e, se houver interesse, em realizar iniciação científica. Na minha opinião, nada pode ser mais motivante do que estar na frente das descobertas que as outras pessoas utilizarão anos mais tarde... Fui colega do Tiago no Mestrado e há muito tempo ouvi falar da Sara e de como este projeto surgiu: em um trabalho de uma disciplina. Nestas situações, às vezes os alunos fazem trabalhos "sem graça", com o único objetivo de não zerar a nota... Mas a Sara propôs algo que até hoje lhe rende bons frutos, como ela faz questão de dizer logo abaixo. Por favor, alunos, prestem atenção nas duas últimas perguntas e deixem-se contaminar pelo brilho nos olhos que a ciência pode nos dar. Sejam ousados, dediquem-se e aproveitem as oportunidades!

   Bem, mas voltando ao nosso assunto de hoje, apresento os convidados portugueses, que posteriormente explicam o seu projeto e os resultados que já obtiveram:
  A Sara Andrade é formada em Bioquímica  pela Universidade do Porto, possui Mestrado em genética Molecular pela Universidade do Minho e atualmente é estudante de doutoramento em Endocrinologia na Universidade de Santiago de Compostela (orientada por Felipe Casanueva, Marcos Carreira e Mariana Pereira Monteiro). 
  O Tiago Morais também é formado em Bioquímica pela Universidade do Porto, foi meu colega no Mestrado em Toxicologia Analítica Clínica e Forense (Universidade do Porto) e atualmente é estudante de doutoramento em Endocrinologia na Universidade de Santiago de Compostela (orientado por Mariana Pereira Monteiro, Felipe Casanueva, e Marcos Carreira).

Então,  o que exatamente eles estão tentando fazer?

Sara - Resumindo, estamos a tentar criar uma vacina para tratamento da obesidade. A ghrelina é um hormônio produzido pelo estômago e que atua no cérebro. Ela é o único hormônio conhecido que aumenta o apetite e consequentemente a ingestão alimentar. Em pessoas obesas, os seus níveis estão muito baixos, mas, com a perda de peso, os níveis sobem para níveis mais elevados do que uma pessoa de peso normal, dificultando uma perda de peso sustentada. E aí entra a nossa vacina: nós queremos neutralizar a subida dos níveis de ghrelina em resposta a perda de peso, o que permitiria, com a ajuda de modificações na dieta e nos hábitos de exercício físico uma perda de peso mais constante sem picos no apetite.

Tiago - Uma das estatísticas mais assustadoras é que mesmo depois de terem perdido peso a maior parte das pessoas ao fim de 5 anos recupera o peso perdido conforme pode ser verificado neste trabalho). Portanto, o que nós basicamente nos propomos não é tanto ajudar as pessoas obesas a perder peso de uma forma puramente farmacológica, mas a tentar ajudar as pessoas que estão em processo de perda de peso a acelerar este processo e posteriormente a manter um peso "normal" a longo prazo.

E isso não pode ser perigoso?

Tiago - A ghrelina esta associada a mais que uma função no organismo, produzindo exclusivamente efeitos sobre o apetite. Regula por exemplo a secreção do hormônio do crescimento e existem pelo o menos um estudo onde se mostra que bloqueando os receptores de ghrelina com um antagonista leva a um aumento de pressão arterial em ratos. Para além do mais, a ghrelina tem o efeito de aumentar o prazer no ato de comer, e bloquear esta ação pode levar a disfunções na regulação da química cerebral provocando depressão e aumento da ansiedade por exemplo. Daí a nossa tentativa de reduzir o nível de ghrelina circulante sem no entanto a neutralizar a 100%



E o que vocês já conseguiram fazer?


Sara - Foi desenvolvido um imunoconjugado de ghrelina com proteína NS1 do vírus da língua azul (BTV) como substância imunogênica que foi inoculado em camundongos normoponderais e com obesidade induzida pela dieta. Com este imunoconjugado foi conseguida a indução da produção de anticorpos específicos anti-ghrelina com capacidade de neutralização dos efeitos biológicos deste hormônio. Ou seja, houve uma diminuição da ingestão alimentar diária e da ingestão alimentar aguda nas 24h após a imunização, um aumento do gasto energético e uma diminuição de sinais de aumento de apetite no hipotálamo basal.
Tiago -  São resultados encorajadores, mostram que o conceito de realizar uma vacina por estes meio é seguro, já que também não vimos sinais de dano, e que o conceito resulta. Não estamos propriamente na reta final mas é um ótimo ponto de partida!

Isto significa que em breve teremos a cura para a obesidade?

Sara - Não. A obesidade é uma doença muito complexa e em que há muitas vias a ter em conta. Mas é mais um passo no que diz respeito a tentar melhorar esta epidemia.


Tiago - É um problema multi-fatorial, e mais complexo do que muitas vezes se pensa. Aliás, apesar de termos acesso a toda a informação necessária, isto é, sabermos que é fundamental o exercício para sermos saudáveis e sabermos, não necessariamente o estilo de dieta a seguir, mas que devemos evitar comer em excesso, continuamos com uma população crescentemente obesa, com um aumento de obesidade infantil para níveis preocupantes. Pior ainda, a nível mundial os países como a Índia, a medida que começam a ficar mais ricos, começam a "imitar" os hábitos alimentares dos ditos "países ocidentais" com consequências significativas para os níveis da obesidade e da diabetes. Assim, um comprimido ou uma vacina que fosse milagrosa (e já começam a surgir ideias para combater a obesidade e a diabetes ao mesmo tempo com um só comprimido) não ia combater o nosso desequilibro alimentar, que provoca outro tipo de problemas metabólico.


 Como surgiu a ideia deste projeto científico?


Sara - Surgiu como um projeto teórico de uma cadeira de microbiologia durante a graduação. Na altura, eu e a minha colega, a Filipa Pinho, tivemos a ideia de criar uma vacina anti-obesidade baseando-nos numas vacinas terapêuticas para doenças não infecciosas que usavam capsídeos virais para conseguir uma resposta imune contra moléculas que de outra forma não o fariam. Afinal, terminamos a pedir ajuda  do ponto de vista mais médico à Dra. Mariana Monteiro, que viu potencial no projeto, nos propôs trabalhar com ela e nos ajudou a dar forma ao trabalho. E desde então temos vindo a trabalhar no projeto, com a mais recente adição do Tiago.


Comentem que tipo de experiência pessoal este trabalho e a experiência na investigação científica já trouxe a vocês:

Sara - Este trabalho, acima de tudo, levou-me a trabalhar em grandes equipes, com pessoas extremamente competentes e que
diariamente me ensinam coisas. A investigação científica baseia-se na partilha de conhecimentos e na procura de sempre saber um pouco mais. E quando a isto se associa conseguir aproximar-nos de algo que pode realmente ter um impacto na vida das pessoas é realmente motivante.

Tiago - Concordo a 100%. Não só trabalhamos em bons ambientes com gente que sabe o que faz, como durante este tipo de trabalho temos também acesso a trocar ideias com gente de nível muito elevado que nos motiva sempre para sermos melhores e sabermos um pouco mais hoje do que sabíamos ontem. E trabalhar com algo onde conseguimos fazer ciência básica mas que tem uma ponte muito óbvia para uma aplicação clínica da sempre outro tipo de motivação extra.

   Muito obrigada Tiago e Sara!
  Aqui no blog, continuaremos acompanhando o desenvolvimento deste projeto, mas enquanto não temos uma vacina anti-ghrelina disponível, aposte nos métodos tradicionais... Ou seja, de momento, se você quer evitar o efeito sanfona, o método com maior chances de sucesso é uma mudança no estilo de vida, que passe por uma reeducação alimentar consistente acompanhada de exercícios físicos.
  E se você se interessou ainda mais pelos trabalhos da Sara e do Tiago, você pode buscar os artigos científicos do grupo a respeito destes estudos:

Imunização contra ghrelina para tratamento da obesidade

A vacina anti-ghrelina: uma nova abordagem no tratamento da obesidade

Vacinas para doenças metabólicas



quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Potencial antibiótico a partir do veneno da Jararaca

  Segundo a Organização Mundial da Saúde, infecções causadas por bactérias ainda ocupam o topo da lista de causa de morte. Elas podem ser combatidas com antibióticos. Porém, as bactérias possuem uma grande capacidade de se adaptar aos medicamentos disponíveis, tornando-se resistentes a eles.


 Como surgem as chamadas "superbactérias". Ilustração: https://eco4u.wordpress.com/2011/02/24/uso-indiscriminado-de-medicamentos-oms-alerta-sobre-o-perigo-das-superbacterias/arte_superbacteria-2/

 Existem vários pesquisadores dedicados a descoberta de novos antibióticos, mas estes estudos levam tempo. Recentemente, tivemos a boa notícia da descoberta de um novo composto antibiótico, a teixobactina, que funcionou contra as "superbactérias" em modelos animais e in vitro. Se este potencial for confirmado em humanos, estaremos diante de uma nova classe de medicamentos, com compostos isolados a partir de bactérias presentes no solo.  A notícia foi recebida com muito entusiasmo pois há muitos anos uma nova classe de antibióticos não era descoberta. Mais detalhes sobre a teixobactina, aqui:


  Bom, mas por aqui também temos boas notícias! Durante o último ano, o agora farmacêutico Lucas Henrique Cendron, no âmbito do seu Trabalho de Conclusão do Curso de Farmácia, testou a atividade antibacteriana do veneno da jararaca (Bothrops jararaca). 

Esta é a serpente peçonhenta Bothrops jararaca. Ela pode ser reconhecida pela coloração marrom esverdeada, com desenhos na forma de “V” invertido em cor preta ou castanha escuro, cauda lisa. Em caso de dúvida, não se aproxime!

 Já haviam outros estudos que nos indicavam que este veneno era promissor contra bactérias, mas a grande novidade do Lucas é que no seu trabalho nós testamos o veneno contra 16 bactérias resistentes isoladas de pacientes internados em um hospital local, obtendo inibição no crescimento de todas elas quando incubadas com o veneno.

Como é feito este teste?
 Através de um antibiograma, como o da foto abaixo (foto do material suplementar do artigo do Lucas, link disponível abaixo).




 Aqui temos duas placas com um "tapete bacteriano".  Cada disco assinalado com letras ou números correspondem a um tipo de tratamento. C+ significa que o disco está impregnado com o antibiótico padrão, o tratamento atualmente considerado efetivo para esta bactéria. É o nosso controle positivo, que deverá funcionar, ou seja, deveremos ter inibição do crescimento da bactéria conforme pode ser observado nas duas placas pelo halo transparente ao redor do C+, que significa que nas proximidades do antibiótico as bactérias não cresceram). O C- é o controle negativo, para garantir que nosso teste está correto. Não deverá ocorrer inibição do crescimento da bactéria. SM é a nossa solução mais concentrada de veneno, e 1,2,3,4 e 5 representam diluições do veneno. Repare que na primeira placa, é possível observar inibição mesmo com a diluição 3. E na segunda placa, a solução mais concentrada do veneno (SM) e a solução diluída 1 apresentam um halo de inibição com maior diâmetro do que o tratamento padrão disponível. Isto significa que o veneno da jararaca apresenta potencial antibacteriano contra estas bactérias.

 Mais detalhes sobre este estudo bem como a discussão das suas limitações e perspectivas encontram-se disponíveis em:

http://www.scirp.org/journal/PaperInformation.aspx?paperID=52046#.VL8R7ivF9UU


 Também falamos um pouquinho sobre este trabalho no programa Universidade Aberta, da TV UPF: 



 Apesar dos resultados promissores do Lucas e de vários outros trabalhos, vale lembrar que uma bactéria pode tornar-se resistente em poucas horas. Já o desenvolvimento de um novo medicamento para combatê-la demora cerca de mais de 20 anos para ficar pronto. E muitas vezes, os compostos que eram promissores inicialmente se revelam inadequados em fases posteriores. Ou seja, as bactérias ainda estão em vantagem e a situação é preocupante!

 Então, o que você pode fazer para ajudar?

 Se você for estudante de farmácia e se interessou pelo assunto, pode me procurar para fazer iniciação científica neste projeto e assim, continuarmos com estas pesquisas.

 Mas, se você não é da área, mesmo assim, pode ajudar e muito!

Como? 

 Fazendo um uso racional dos antibióticos, que inclui:
- Não utilizar antibióticos quando não for necessário.
-Seguir a risca o horário e o regime de administração dos antibióticos, para não dar chance de selecionar bactérias resistentes. Ou seja, você deve tomar a sua medicação no horário combinado e deverá seguir tomando a medicação até o fim do tratamento. Mesmo que já se sinta melhor antes disso! E qualquer dúvida, recorra ao seu farmacêutico.

 Por que?

 Porque é o mau uso dos antibióticos que muitas vezes selecionam bactérias resistentes! Conscientize-se e ajude a conscientizar seus amigos e vizinhos. Pois você não está garantido se fizer certo e os outros não...